O que está por trás do “marketing verde” das empresas
Nos últimos anos, o termo sustentabilidade passou de diferencial para obrigação. Embalagens “eco”, campanhas sobre neutralização de carbono e promessas de reciclagem se tornaram frequentes.
Mas por trás desse discurso, cresce uma prática perigosa: o greenwashing corporativo, quando empresas vendem uma imagem ambientalmente responsável sem, de fato, mudar seus processos produtivos.

Especialistas alertam que essa “maquiagem verde” cria desinformação, atrapalha o avanço real da economia sustentável e confunde o consumidor
O que é greenwashing
O termo greenwashing — uma mistura de “green” (verde) e “whitewash” (encobrir) — surgiu nos anos 1980, quando o ambientalista Jay Westerveld criticou um hotel que se dizia ecológico por pedir aos hóspedes que reutilizassem toalhas, enquanto desperdiçava água e energia em larga escala.

Desde então, a palavra se tornou símbolo de falsas promessas ambientais. Empresas em diferentes setores — de cosméticos a energia — adotam o discurso verde como estratégia de marketing, sem realizar mudanças reais na produção ou nas cadeias de fornecimento.
Exemplos recentes no Brasil e no mundo
No Brasil, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) analisou campanhas publicitárias de grandes marcas de cosméticos e alimentos em 2023. O estudo revelou inconsistências entre o discurso e a prática, como:
- Embalagens “100% recicláveis” que não são aceitas pelos sistemas municipais de reciclagem;
- Compensações de carbono sem auditoria independente;
- Produtos “naturais” com insumos de origem fóssil.
Na Europa, a Comissão Europeia anunciou em 2024 novas regras para proibir alegações ambientais sem comprovação científica, após descobrir que metade das campanhas verdes era enganosa.
Quando sustentabilidade vira apenas propaganda
Nem toda ação ambiental comunicada por uma marca é greenwashing. O problema surge quando a narrativa supera os resultados concretos.
“O problema não é falar sobre sustentabilidade, é falar mais do que se faz”, explica Marina Azevedo, professora de Gestão Ambiental da USP.
“Empresas realmente comprometidas publicam dados auditáveis, adotam metas claras e integram a sustentabilidade ao negócio.”
Azevedo lembra que transparência e mensuração são palavras-chave para diferenciar quem age de quem apenas comunica.
O papel do consumidor e da regulação
A pressão por práticas reais vem aumentando. Ferramentas como o aplicativo Moda Livre, que avalia marcas de vestuário quanto à responsabilidade ambiental e social, ajudam consumidores a fazer escolhas mais conscientes.

Órgãos como o Conar e o Ministério Público Federal também têm analisado denúncias de propaganda enganosa verde.
Para o advogado ambientalista Caio Rodrigues, “o greenwashing é uma forma de desinformação ambiental. Precisamos de leis e punições mais rigorosas para proteger o consumidor e o meio ambiente”.
Caminhos para uma sustentabilidade verdadeira
De acordo com especialistas, o combate ao greenwashing depende de três pilares principais:
- Transparência: relatórios ambientais auditados e acessíveis ao público;
- Metas reais: redução de emissões, eficiência energética e uso responsável de recursos;
- Educação do consumidor: incentivo ao questionamento e ao consumo consciente.
“O futuro das marcas está na coerência”, afirma Marina Azevedo.
“Ser sustentável não é fazer marketing — é mudar a forma de produzir.”
Como identificar greenwashing
Dicas práticas para o consumidor:
- Desconfie de slogans genéricos, como “amigo da natureza” ou “eco”, sem comprovação;
- Verifique se há certificações reconhecidas, como FSC, ISO 14001 ou selo Eureciclo;
- Pesquise se a empresa publica relatórios de sustentabilidade auditados;
- Atenção às campanhas que exaltam um único aspecto verde, ignorando outros impactos.
O desafio da transparência
Em um mercado cada vez mais competitivo, o selo verde se tornou um ativo de reputação. Mas usar o ambientalismo como estratégia de marketing sem ações concretas pode sair caro — tanto em credibilidade quanto em penalidades legais.
A transparência, portanto, é o novo diferencial.
Empresas, governos e consumidores têm responsabilidade compartilhada para transformar o discurso sustentável em prática real.
